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Recomeçando 

Tempos difíceis nos mostram quem somos  

Você já percebeu como tempos difíceis nos mostram quem nós realmente somos? Quando vem alguma crise ou dificuldade para resolver nós mostramos aquilo que está dentro de nós que normalmente tentamos conter ou esconder. É interessante que na hora do aperto, das extremas dificuldades, nos momentos em que somos levados ao extremo, nós demonstramos sentimentos e pensamentos que estão dentro de nós que talvez nem mesmo nós sabemos ou reconhecemos.  

Por exemplo: nós podemos achar errado quem fala palavrão ou algo assim, mas se estamos no trânsito e alguém faz algo que nos incomoda já soltamos aquele xingamento. Ou podemos ser pessoas que falam muito de confiar em Deus, de crer no poder de Deus e na sua soberania, mas quando uma doença grave nos atinge nós nos desesperamos, entramos em estado de profundo sofrimento e a confiança desaparece.  

Esses acontecimentos extremos nos mostram o que realmente está dentro de nós, nos mostram quem nós somos. Isso é interessante, pois se prestarmos atenção podemos perceber o que é verdadeiro em nós, e o que na verdade apenas estava em nossa mente, mas que ainda não passou pelo nosso coração.  

Nós estamos no mês de janeiro, esse é um mês marcado por acontecimentos que nos fazem repensar algumas coisas, onde temos que recomeçar ou parar atividades. Um novo ano traz consigo essa proposta de recomeçar, de mudar, de tomar decisões que alterarão nosso futuro. Para alguns isso é mais forte, para outros menos, mas é um bom tempo para pensarmos em como nós estamos lidando com os recomeços que a vida nos proporciona.  

Será que as dificuldades que enfrentamos em 2022 nos fizeram recomeçar com sabedoria? Os tombos que levamos serviram para nos ajudar a caminhar de forma a não cair mais, ou estamos ainda caminhando do mesmo jeito, sendo a mesma pessoa que éramos, errando da mesma forma?   

Estamos vivendo a fé e a nossa intimidade com Jesus de forma que estamos sendo realmente transformados em nosso íntimo, nos tornando mais parecidos com Cristo a cada dia? Nossas atitudes, escolhas, formas de agir e pensar nesses momentos podem ser um indicativo do quanto Jesus tem nos transformado verdadeiramente, ou se somos apenas uma casca cristã, vivendo de aparência.  

Quero convidar a vermos a história de uma personagem que viveu uma transformação profunda em sua vida e que manteve seus princípios e convicções mesmo num tempo extremamente difícil, ela não voltou atrás nas suas convicções e sua fé, mesmo que todas as circunstâncias ao redor apontavam para isso.  

"Na época dos juízes houve fome na terra. Um homem de Belém de Judá, com a mulher e os dois filhos, foi viver por algum tempo nas terras de Moabe. O homem chamava-se Elimeleque, sua mulher Noemi e seus dois filhos Malom e Quiliom. Eram efrateus de Belém de Judá. Chegaram a Moabe, e lá ficaram. Morreu Elimeleque, marido de Noemi, e ela ficou sozinha, com seus dois filhos. Eles se casaram com mulheres moabitas, uma chamada Orfa e a outra Rute. Depois de terem morado lá por quase dez anos, morreram também Malom e Quiliom, e Noemi ficou sozinha, sem os dois filhos e o seu marido. Quando Noemi soube em Moabe que o Senhor viera em auxílio do seu povo, dando-lhe alimento, decidiu voltar com suas duas noras para a sua terra. Assim ela, com as duas noras, partiu do lugar onde tinha morado. Enquanto voltavam para a terra de Judá, Noemi disse às duas noras: "Vão! Voltem para a casa de suas mães! Que o Senhor seja leal com vocês, como vocês foram leais com os falecidos e comigo. O Senhor conceda que cada uma de vocês encontre segurança no lar doutro marido". Então deu-lhes beijos de despedida. Mas elas começaram a chorar bem alto e lhe disseram: "Não! Voltaremos com você para junto de seu povo! "Disse, porém, Noemi: "Voltem, minhas filhas! Por que viriam comigo? Poderia eu ainda ter filhos, que viessem a ser seus maridos? Voltem, minhas filhas! Vão! Estou velha demais para ter outro marido. E mesmo que eu pensasse que ainda há esperança para mim — ainda que eu me casasse esta noite e depois desse à luz filhos, iriam vocês esperar até que eles crescessem? Ficariam sem se casar à espera deles? De jeito nenhum minhas filhas! Para mim é mais amargo do que para vocês, pois a mão do Senhor voltou-se contra mim! "Elas então começaram a choram bem alto de novo. Depois Orfa deu um beijo de despedida em sua sogra, mas Rute ficou com ela. Então Noemi a aconselhou: "Veja, sua concunhada está voltando para o seu povo e para o seu deus. Volte com ela! " Rute, porém, respondeu: "Não insistas comigo que te deixe e não mais a acompanhe. Aonde fores irei, onde ficares ficarei! O teu povo será o meu povo e o teu Deus será o meu Deus! Onde morreres morrerei, e ali serei sepultada. Que o Senhor me castigue com todo o rigor, se outra coisa que não a morte me separar de ti! "Rute 1:1-17 

O livro de Rute é um daqueles livros da Bíblia que a gente se pergunta por que está ali? Ele é um livro pequeno e que conta a história de uma família, mais especificamente de duas mulheres, pois os demais personagens são bem menos citados na história.  

É um relato de como foi a vida dessas mulheres de forma resumida, mas contendo o essencial para o todo das Escrituras mostrando o que elas enfrentaram de desafios e como lidaram com os recomeços que a vida lhes trouxe. Elas não escolheram passar por esses recomeços, foi necessário para sobreviverem, para continuar. São essas situações extremas que acontecem e que nos obrigam a tomar decisões, a mudar, a reagir.  

O livro de Rute tem sua importância no todo da Bíblia por alguns motivos. Ele não é apenas um livro que fala de como uma nora foi amável e fiel a sua sogra, vai muito além disso. Rute é um livro que fala de redenção, que aponta para Cristo, que nos ensina a ser fiel e permanecer em Deus mesmo quando para todos ao nosso redor não faz mais sentido. Nos ensina também que não basta ser fiel a Deus que tudo vai bem, ele não é um livro que nos ensina sobre prosperidade e ser vencedor, pois o que essas mulheres perdem não é mais possível recuperar. Rute nos ensina sobre confiança em Deus, sobre fé verdadeira, sobre fidelidade e amor ao próximo, sobre verdade e integridade. Valores que precisamos rebuscar em nossa sociedade e em nossas igrejas, valores do Reino, valores de discípulos que são transformados pela Palavra.  

Vamos ao contexto do livro: 

Essa história se passa no tempo dos juízes, antes ainda de haver reis em Israel. Era um tempo marcado por obediência e desobediência. O povo de Deus oscilava muito entre permanecer no caminho do Senhor e se desviar. A missão dos juízes era trazer o povo de volta aos caminhos do Senhor.  

Num período de grande fome, uma família de Belém, da tribo de Judá decide mudar-se para uma terra estrangeira, para Moabe, na tentativa de sobreviver a essa situação de fome e dificuldades. Eimeleque vai com Noemi sua esposa e seus dois filhos morar em Moabe.  

Em Moabe os dois filhos se casam com mulheres moabitas, Orfa e Rute. Eles ficaram por lá cerca de 10 anos e nesse período faleceu Eimeleque e depois seus dois filhos, restando então as três mulheres viúvas. Nessa situação Noemi precisa buscar um novo jeito de sobreviver. Já que as viúvas não tinham pensão naquela época e não era nada fácil conseguir seu sustento e comida, ela decide voltar para sua terra, para sua parentela, pois lá ela sabia que havia leis que ajudavam as viúvas, leis instituídas pelo próprio Deus. 

Tomando essa decisão ela comunica Orfa e Rute e as envia de volta as suas famílias, pois como ainda eram mais jovens poderiam casar-se novamente e ter uma vida melhor, já que ser viúva não trazia garantia nenhuma de estabilidade e tranquilidade. 

É interessante perceber que essas mulheres possuíam um laço forte, elas se amavam e a despedida é dolorosa para elas. Noemi as agradece pelo tempo que passaram juntas, ela se alegra com as noras que teve. Mesmo assim, ela sabe que três viúvas sozinhas não conseguiriam buscar o seu sustento e viveriam sempre na miséria, mendigando o alimento. Noemi as manda de volta a suas famílias para que tenham uma vida melhor.   

Orfa atende a ordem da sogra e segue para sua casa, no entanto, Rute decidi ficar e prosseguir com Noemi. Orfa não faz algo descabido para o contexto que elas estavam vivendo, ela estava pensando no que era melhor para ela, estava pensando na sua sobrevivência, muito provavelmente a maioria de nós concordaria com a ação de Orfa, no momento do aperto, da fome, da miséria, preciso pensar em mim mesmo e seguir o conselho de Noemi. Mas Rute não pensa em si mesma ao continuar com Noemi, ela abre mão do que seria o mais seguro e mais confortável para ela para cuidar de sua sogra, que está velha para o trabalho pesado e precisa de alguém que lhe cuide e ajude.  

Sendo confrontados pela Palavra 

O testemunho de Rute, assim como de tantos outros do Antigo Testamento, confronta os nossos princípios, a nossa forma de agir e pensar. Voltar para sua família era o mais seguro, mais fácil, mais cômodo. Permanecer com Noemi implicava em passar por dificuldade, por perigos para conseguir comida, cuidar de uma senhora em seus últimos anos de vida, sustentar a si mesma e a sua sogra e, ainda, mudar-se para uma terra estrangeira, que ela nem mesmo conhecia, correndo risco de ser desprezada por não ser de lá.  

Sejamos sinceros, a forma como Rute age diante de uma extrema dificuldade nos confronta, pois podemos nos perguntar: será que nós nos manteríamos firmes nos valores e princípios que afirmamos ter numa situação assim?  

No versículo 15 Noemi pede mais uma vez para Rute acompanhar Orfa e ir pra casa de seus pais. Ao fazer isso ela diz: “volte para o seu povo e o seu deus”. Aqui há uma questão de pertença e de identidade envolvida. Com certeza ,nos anos de casada Rute e Orfa aprenderam sobre o Deus de Israel, sobre seu poder, sua forma de agir. Muito provavelmente, aprenderam muito com a sogra. Ao mandá-las embora Noemi as envia para a sua vida anterior, com suas crenças anteriores, sua família e deuses anteriores.  

A questão é: Elas seguiam ao Deus de Israel apenas por serem casadas com israelitas, ou elas realmente conheciam a esse Deus? Porque se era só por casamento era fácil voltar atrás, aos velhos hábitos, a sua família de sangue.  

O contexto todo da história mostra que o mais favorável para Rute era ficar em Moabe com sua família, mas ela não o faz. Ao ouvir esse envio de Noemi, Rute faz um juramento a sua sogra: “Não insistas comigo que te deixe e não mais a acompanhe. Aonde fores irei, onde ficares ficarei! O teu povo será o meu povo e o teu Deus será o meu Deus! Onde morreres morrerei, e ali serei sepultada. Que o Senhor me castigue com todo o rigor, se outra coisa que não a morte me separar de ti" Rute 1:16,17 

Ela está convicta de que irá com Noemi e não a abandonará. Nem mesmo abandonará a Deus, o Deus de Israel. A identidade de Rute foi transformada naquela família. O povo dela já não era mais os moabitas, o Deus dela não era mais o deus dos moabitas. Ao ser parte daquela família e viver com eles, Rute foi transformada profundamente e passou a pertencer ao povo de Israel e ao Deus de Israel.  

A mudança de Rute é tão profunda e radical, que quando vem uma situação extrema de viuvez, de pobreza, de desespero extremo, Rute não retrocede, ela não retorna ao que era antes, pois ela já não é mais aquela pessoa. Quando Noemi a manda voltar ela se recusa e afirma: “o teu povo é meu povo e o teu Deus é o meu Deus”. Isso fazia sentido para Rute, o que não fazia sentido era negar tudo isso e voltar a ser quem ela era antes de casar-se com um israelita e conhecer o verdadeiro Deus.  

Olhando para a história de Rute eu lembrei de um exemplo que o professor Martin Weingaertner nos deu na faculdade. Nós o questionamos sobre a questão do casamento, como saber se um casamento é segundo o coração de Deus ou não? Como entender esse processo e saber se o casal vive debaixo da benção de Deus ou não, já que nós (ministros religiosos) somos pessoas responsáveis por dar essa benção no dia da união matrimonial. Ele nos respondeu mai ou menos assim: “o que vai definir isso não é como começa o casamento, mas sim como ele termina”. Que resposta, que raciocínio! O que define se um casal vive sobre a benção e o guiar de Deus não é a forma que começaram essa caminhada, pois sabemos que muitos começam aos trancos e barrancos, mas sim como terminaram a caminhada.  Isso porque só lá no fim veremos se era verdadeiro o que prometeram ou não, só no fim saberemos se o que viveram foi real ou mentiroso.  

Podemos aplicar isso a caminhada de fé. Quantas vezes nós julgamos as pessoas por aquilo que enxergamos delas, classificamos a caminhada de cada uma, olhando para um e dizemos o quanto ele é crente, o quanto ama a Deus e o serve e olhamos para outro e apontamos seus defeitos, seus erros e pecados, como se pudéssemos classificar quem verdadeiramente tem Jesus como centro de sua vida e quem não tem.  

Nós só saberemos lá no final! 

Quando se levantam situações de extrema dificuldade e extremas mudanças essas pessoas podem nos surpreender, de forma positiva o negativa. Nós não conhecemos o coração, a verdade que está lá dentro, nós conhecemos o externo, apenas Deus conhece o interno, o real e o verdadeiro.   

Por isso, cabe a nós olharmos um pouco mais para nós mesmos. Precisamos ficar atentos ao que em nós é só casca. Se estamos vivendo algo apenas porque convém e é mais fácil, no momento em que ficar difícil nós vamos retroceder, vamos voltar atrás, aos velhos hábitos, aos velhos deuses. Isso é algo que chama atenção, demonstramos uma conduta cristã por sabermos de cabeça que é o que precisamos mostrar, mas quando não nos cobram mais aquilo então mostramos quem realmente somos.  

Foi no momento de extrema dificuldade que Rute provou a sua sogra Noemi que ela não era mais uma Moabita, o deus dela não era mais aquele, o lugar dela não era mais aquele, mesmo que era o melhor a se fazer, o mais fácil, o mais seguro. Rute conheceu o verdadeiro Deus e o seu povo e sua identidade estava firmada ali.  Sem falar que seu amor a sua sogra era verdadeiro, um amor que faz sacrifícios e que não abandona mesmo nas piores dificuldades.  

Rute aponta para Cristo. Na sua fidelidade, na sua convicção de prosseguir até o fim, mesmo que ela mesma sofreria por isso, na sua fidelidade a Deus, na sua convicção de identidade, ela sabia quem era, quem se tornou e nada mudaria isso.  

Sejamos verdadeiros 

A transformação de Rute pode também ser a nossa transformação. Ela precisa ser real e profunda. Estar numa comunidade e dela ser parte, ser corpo de Cristo, viver segundo os valores do Reino e amar a Deus acima de todas as coisas não pode ser algo que fazemos apenas quando convém, quando está fácil.  

Para todos nós chegará momentos em nossa vida que nossa identidade será testada e questionada e aí o que vai ficar, o que vai realmente mostrar quem somos e se pertencemos a esse Deus ou não, não é tudo o que fizemos no passado pela igreja, não é tudo o que vivemos lá trás, lembre-se não é como começa, mas sim como termina. Trata-se de manter-se firme até o fim!  

Se é tempo de recomeçar, se Jesus está te chamando para um recomeço então faça isso com verdade. Que não seja apenas um recomeço externo, para outros verem, mas que possamos recomeçar verdadeiramente na presença do Senhor e que lá no fim da vida, quando nossos olhos fecharem para essa vida, que possamos afirmar como Paulo: “Eu já estou sendo derramado como uma oferta de bebida. Está próximo o tempo da minha partida. Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé”. 2 Timóteo 4:6,7 

Afinal, aqui o nosso tempo é limitado, ele termina e tudo bem que ele termina, nós não fomos criados para o aqui e agora, fomos criados para a eternidade, vivamos então de forma a aguardar a eternidade ao lado do nosso salvador!